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news - 10 October 2018

Entrevista de Tiago Dionísio à Lusa sobre a banca em Angola

ENTREVISTA: "O pior para a banca em Angola já deve ter passado" - Consultor

*** Serviço áudio disponível em www.lusa.pt ***

 

Lisboa, 10 out (Lusa) - O economista-chefe da consultora Eaglestone, Tiago Dionísio, considerou hoje à Lusa que "o pior já deve ter passado" para a economia e para o setor bancário angolano e que as perspetivas são "moderadamente otimistas".

Em entrevista à Lusa a propósito de um estudo sobre a banca angolana, Tiago Dionísio disse que "as perspetivas são moderadamente otimistas, não só para a economia angolana, mas também para o setor bancário", que enfrentou no ano passado o pico da crise, nomeadamente no nível de crédito malparado.

"O pior já deverá ter passado", vincou o analista, defendendo que a queda dos resultados deveu-se essencialmente às condições económicas do país e não a problemas específicos do setor bancário em Angola.

"Olhando para os resultados dos bancos, conclui-se que a atual situação económica bastante difícil teve impacto nos resultados", disse Tiago Dionísio, destacando que "o nível de crédito malparado triplicou nos últimos três anos" e que "apesar dos lucros terem caído em 2017 face a 2016, o sistema bancário em Angola continua bastante bem capitalizado e o rácio de solvabilidade do setor continua muito acima de 10%, o nível mínimo exigido pelo Banco Nacional de Angola".

O crédito malparado, ou seja, o crédito que os bancos têm dificuldade em cobrar, é um problema que o sistema financeiro angolano deverá continuar a enfrentar nos próximos tempos, o que obrigou a que os níveis de aprovisionamento [reservas em caso de incumprimento dos clientes] tivessem de ser aumentados e, com isso, descido os lucros.

"A situação económica está a melhorar mas o crescimento não será fantástico como foi na década entre 2005 e 2015; o crescimento recupera mas será lento, e o facto de as taxas de juro continuarem bastante elevadas vai fazer com que a melhoria do crédito malparado não aconteça de um dia para o outro, demorando tempo a cair gradualmente", defendeu o economista-chefe da Eaglestone.

"O que se verificou em 2017 é que os proveitos, por exemplo, de transações comerciais de venda de moeda estrangeira aos clientes, foram inexistentes devido à escassez de moeda estrangeira, e isto levou a que outros proveitos dos bancos tivessem caído e isso afetou as receitas", acrescentou.

Para o futuro, Tiago Dionísio antecipa um movimento de concentração na banca, defendendo que há demasiados bancos a operar num mercado relativamente pequeno.

"Angola tem muitos bancos a operar no país, são 30, e um dos temas em 2019 e 2020 será o das fusões e aquisições; uma das características do mercado financeiro angolano é haver muitos pequenos acionistas e alguns com participações em vários bancos; tendo em conta o aumento da concorrência no setor e o facto de o BNA estar cada vez mais exigente em termos de regulação e supervisão, termos tantos bancos em Angola vai tornar-se insustentável", defendeu.

Questionado sobre se esse movimento de concentração será positivo, Tiago Dionísio respondeu: "É positivo porque torna o sistema mais resiliente, mais forte, porque se houver um pequeno banco intervencionado, não há risco sistémico, mas nunca deixa de ser um problema para o setor quando surge uma notícia de que um banco ou vários de pequena dimensão estão com problemas, por isso é de todo o interesse a nível da economia do país te rum sistema financeiro cada vez mais forte".

A análise sobre os resultados da banca angolana em 2017 destaca que os lucros caíram para 15% face aos 30% registados em 2010, enquanto o crédito malparado triplicou para mais de 35% no ano passado.

Os dados de 2017 mostram que mais de 80% dos empréstimos e dois terços dos depósitos foram feitos em kwanzas; o total de ativos destes bancos chegou a 58,7 mil milhões de dólares, "o que representa uma subida de 3,1% face ao ano anterior" e é considerado pela Eaglestone como "um aumento muito modesto tendo em conta a evolução registada nos últimos anos".

Apesar do crescimento robusto nos últimos anos, "o total de empréstimos caiu 3,5% em 2017 para 18,5 mil milhões de dólares no ano passado, depois de ter subido quase 16% em 2016", lê-se no relatório.

Mário Baptista, Lusa